Desde o surgimento das Capitanias Hereditárias, em 1534, todos os quinze lotes eram administrados por seus donatários. Com a criação do Governo Geral, em 1548, e sua implantação, em 1549, e a chegada de Tomé de Sousa, verificou-se uma mudança administrativa que se sobrepunha às capitanias, sem anulá-las.
Em 1621, com a criação do Estado do Maranhão (sede em São Luís) e do Estado do Brasil (sede em Salvador), passou, automaticamente, a capitania de João de Barros (Ceará), a fazer parte do primeiro Estado, em consequência da suposta maior facilidade nas comunicações marítimas da conhecida Costa Leste-Oeste.
Em 1774, com a extinção do Estado do Maranhão, pelo Marquês de Pombal, a Capitania do Ceará ficou dependendo, administrativamente, da de Pernambuco, situação que subsistiu até 1799, quando, por força da Carta Régia de 24 de janeiro, tomou foros de capitania de primeira ordem, permanecendo, apenas juridicamente, ligada à Relação da Bahia e, posteriormente, à de Pernambuco, até 1821.
A primeira vila criada na Capitania do Ceará, a Vila de Aquiraz, ocorreu por Ordem Régia de 13 de fevereiro de 1699 e, até 1816, só havia uma comarca, a da mesma vila, quando então foi criada a Comarca de Crato. Tal situação dera ensejo a que os negócios da Justiça fossem resolvidos no próprio local, pelos proprietários rurais, fato gerador de conflitos entre famílias, como aconteceu, no sul do Ceará, entre Montes e Feitosas, no primeiro quartel do Século XVIII.
Em 1817, a pequena povoação de CASCAVEL teve como juiz ordinário o capitão Joaquim José Pereira Leite e como escrivão interino, Joaquim Gomes Ribeiro. Em 15 de outubro de 1827, foi elevada a juizado de paz, desmembrada e Aquiraz, em cumprimento da Lei Geral de 1824, sendo eleitos o juiz de paz, o capitão Anastácio Lopes Ferreira do Valle, e suplente, o sargento-mor Gonçalo da Silva Monteiro, tendo como escrivão, Francisco José de Almeida.
Criação da Freguesia e do Município
Em 4 de setembro de 1832, foi criada a FREGUESIA DE NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO DO CASCAVEL, por LEI DO CONSELHO DE REGÊNCIA, cujo PRIMEIRO VIGÁRIO foi o aracatiense e deputado geral pelo Ceará, PADRE JOSÉ DA COSTA BARROS.
A Constituição de 1824, outorgada pelo Imperador Dom Pedro I, configurava uma organização político-jurídica soberana e imperial. As Câmaras Municipais passaram a ser regidas pela Lei de 1o de outubro de 1828: “As câmaras das vilas compõem-se de sete membros, para um mandato de quatro anos” (Art. 1o). “São corporações meramente administrativas e não exercem jurisdição contenciosa” (Art. 24).
Na década de 1830, do Século XIX, verificou-se um processo de descentralização, com certa autonomia dos municípios, resultante do Código de Processo Criminal de 1832, e posterior perda dessa autonomia com o Ato Adicional de 1834.
Esse período, iniciado com o DIA DO FICO (9 de janeiro de 1831), refletiu o processo de hegemonia dos proprietários rurais, que então mantinham o poder municipal em suas mãos, uma vez que o município fora aparelhado de mecanismos tais que lhes deram a oportunidade de exercer este poder sem intermediários.
Naquela época, o Império vivia momentos de transição e de muita intranquilidade política. No dia 7 de abril de 1831, o Imperador do Brasil, Dom Pedro I, abdicou do trono em favor de seu filho menor de idade. Assumiu o poder, transitoriamente, a REGÊNCIA, acirrando o ânimo separatista nas províncias.
Em 1833, a Província do Ceará vivia uma verdadeira guerra civil. O coronel de milícias, o jardinense Joaquim Pinto Madeira, agitava os sertões do Cariri, alegando ter sido a abdicação um ato forçado; desejava reconduzir o Imperador ao Trono. Rendeu-se, em 13 de outubro de 1834, no Crato, e foi fuzilado, aos 28 de novembro do mesmo ano, após julgamento pelos próprios inimigos.
O Conselho do Governo Provincial, em RESOLUÇÃO DE 6 DE MAIO DE 1833, CRIOU O MUNICÍPIO DE CASCAVEL (22a Vila da Província), com sede na pequena povoação de mesmo nome. A reunião que a elevou à Vila foi presidida pelo 5o presidente da Província do Ceará, José Mariano d’Albuquerque Cavalcanti, contra o parecer dos conselheiros João Facundo de Castro Menezes (Major Facundo) e José Antônio Machado, desejosos de criar apenas um Julgado (território de jurisdição de alguns juízes municipais).
O major Facundo, chefe político da família Castro, detentora de enorme poder nas decisões da Província, deu parecer desfavorável, por ser filho de Aracati, que sairia prejudicado. Não seria, político-administrativamente conveniente, o desmembramento de parte daquele extenso município, na ocasião compreendendo: Icapuí, Beberibe, parte de Cascavel e Baixinha (hoje Pindoretama).
Em um esforço do Conselho da Província, procedeu-se a divisão judiciária, criando-se as comarcas de Fortaleza, Sobral, Icó, Quixeramobim e Aracati, esta última abrangendo os termos de Cascavel e São Bernardo das Russas.
Um Cascavelense Instala o Município
O MUNICÍPIO FOI SOLENEMENTE INAUGURADO NO DIA 17 DE OUTUBRO DE 1833 (uma quinta-feira), pelo presidente da Câmara Municipal de Aquiraz, o cascavelense, de tradicional família do Riacho Fundo, capitão JOSÉ MARTINHO PEREIRA FAÇANHA, que se fazia acompanhar do respectivo secretário, João Correia de Sá.
Pereira Façanha inaugurou a vila determinando a lavratura da ATA DE INSTALAÇÃO DA NOVA VILLA DE NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO DO CASCAVEL (Ver Documentos), após cumprido o juramento do Santo Evangelho, por cada um dos vereadores, eleitos na forma da Carta de Lei de 1º de outubro de 1828.
Foram empossados, na ocasião, o capitão JOSÉ SIMÕES BRANQUINHO (PRESIDENTE DA CÂMARA), ANTÔNIO SEBASTIÃO SARAIVA, JOÃO FIRMINO DANTAS RIBEIRO, JOSÉ VICTORINO SOARES DANTAS, e LUIZ ANTÔNIO DE ARAÚJO.
O tenente-coronel JOSÉ DE QUEIROZ LIMA, conselheiro da Província (residente no Sítio Mirador, Aquiraz), e o capitão ANASTÁCIO LOPES FERREIRA do VALLE, vereador em Aquiraz no quadriênio anterior, na primeira sessão da nova Câmara, renunciaram aos seus mandatos, sendo substituídos pelos suplentes FRANCISCO JOSÉ BAPTISTA e JOSÉ MARCOS DE ASTRO E SILVA, juramentados e empossados na sessão do dia seguinte, 18 de outubro.
Naquela época, não existia o Poder Executivo Municipal, sendo o presidente da Câmara o Chefe da Municipalidade, função que, em Cascavel, foi exercida, pela primeira vez, pelo capitão da Guarda Nacional, José Simões Branquinho.
A Câmara foi empossada quando floria o municipalismo judiciário, em que estas tinham a dinâmica do poder, sendo autônomas: elegiam inspetores de quarteirão, elaboravam lista tríplice para escolha, pelo presidente da Província, do juiz municipal e do promotor, e as multas e impostos revertiam-se para o custeio de suas despesas. Esta autonomia foi revogada pelo Ato Adicional de 1834.
Criada a Assembleia Legislativa Provincial, para esta foi transferido o poder até então exercido pelos municípios: “A Assembléia Provincial é o foro de competência para legislar sobre a economia e política dos municípios.” (Art. 10, parágrafo 4º). “Os proprietários rurais ampliaram sua área de ação (poder) de municipal para provincial: estes terão que se reagrupar em aliança de cunho mais amplo”.
Primeiros Servidores Municipais
Instalado o MUNICÍPIO, em 17 de outubro de 1833, na sessão do dia seguinte foram nomeados os primeiros funcionários: secretário da Câmara, Francisco de Assis Gomes de Paula; fiscal e suplente, João Ferreira do Valle e João Ferreira dos Santos, respectivamente; procurador, Francisco Moreira da Silva; porteiro e ajudante, respectivamente Francisco Vitorino Ribeiro e Antônio Francisco Ribeiro Securi (este, antes de juramentado, mudou-se para Aquiraz).
João Ferreira do Valle não aceitou o cargo, sendo substituído por Bento Correia Lima, que prestou juramento e assumiu no dia seguinte, 19 de outubro, juntamente com os demais nomeados. Ainda na sessão de 18 de outubro, os vereadores deram, às ruas, as seguintes denominações, aprovadas por unanimidade: RUA DIREITA, RUA DOS LAVRADORES, RUA DO AÇOUGUE, RUA DO COMÉRCIO e RUA DA ALEGRIA e PRAÇA DA MATRIZ.
No dia 19, a Câmara Municipal propôs ao Governo Provincial as listas tríplices para o cargo de juiz municipal (Antônio Sebastião Saraiva, João Firmino Dantas Ribeiro e José Victorino Soares Dantas), e para o de juiz de órfãos (José de Queiroz Lima, Balthazar Ferreira do Valle e Gonçalo da Silva Monteiro).
De conformidade com o art. 14 do decreto de 18 de dezembro de 1832, foram nomeados, interinamente, juiz municipal, Antônio Sebastião Saraiva, e juiz de órfãos, o tenente-coronel José de Queiroz Lima, que prestaram juramento e, imediatamente, entraram em exercício.
Ainda na sessão de 19 de outubro, para o cargo de promotor, foi proposta a seguinte lista tríplice: padre Domingos Carlos de Sabóia, Luiz Antônio de Freitas e João Baptista da Silva, sendo escolhido e nomeado, interinamente, o padre Domingos Carlos de Sabóia que, no dia 21, prestou juramento perante a Câmara e assumiu suas funções.
Consta, ainda, da Ata da sessão de 19 de outubro, que Joaquim José Pereira, convidado para suplente de juiz de paz, não aceitou por ser o agente dos Correios.
Em sua quarta sessão, realizada a 21 de outubro, o Poder Legislativo dividiu o termo em quatro distritos: o da sede, o de Lucas (Beberibe), o de Sucatinga e o de Pedro de Sousa, dando-lhes os respectivos limites.
Os primeiros juízes de paz dos recém-criados distritos foram:
- na sede (vila), Gonçalo da Silva Monteiro, Anastácio Lopes Ferreira do Valle, João Baptista da Silva e Joaquim José Pereira, juramentados no dia 12 de novembro de 1833;
- no distrito de Lucas, Balthazar Ferreira do Valle, Manoel da Costa Nogueira, Leonardo Bezerra Cavalcante e Manoel José Falcão, tendo como escrivão Alexandre Lopes Galvão, juramentados no dia 22 do mesmo mês;
- em Sucatinga, Francisco Correia Lima, Simião Correia Lima, Francisco dos Santos e Manoel de Matos Silva, tendo como escrivão Ignácio Francisco de Jesus, juramentados no dia 11 de janeiro do ano seguinte;
- no distrito de Pedro de Sousa, Teodósio da Costa Nogueira, José da Costa Nogueira Júnior, José Ignácio de Araújo Prata e João Alves da Costa, sendo os três primeiros juramentados a 10 e o último a 20 de fevereiro de 1834, tendo como escrivão Tomás Lopes de Aquino.
No dia 26 (ainda de outubro de 1833), João Gomes Brasil foi nomeado e juramentado professor de primeiras letras.
A Elevação à Cidade
A elevação a município não transformou Cascavel em cidade, pois a sede municipal continuou sendo uma vila. Somente cinquenta anos depois, isto é, no dia 18 de outubro de 1883, é que o deputado, pelo oitavo distrito, coronel Antônio Valente, apresentou, na Assembleia Provincial, o projeto de lei no 32, propondo a elevação da então Vila de Cascavel à cidade, atendendo a pedido de quatro dos sete vereadores de sua Câmara Municipal.
No dia 25, do mesmo mês e ano, o projeto foi submetido à primeira discussão, sendo aprovado, após rejeição de requerimento do deputado padre Sizenando Marcos de Castro e Silva (cascavelense e vigário de Cascavel), que, respaldado pela recusa de três vereadores e pelo abaixo-assinado de sessenta e duas importantes figuras da comunidade – comerciantes, agricultores e criadores – enviado aos deputados clamando contra a promoção, motivados, possivelmente, por razões econômicas, pediu o seu adiamento. Na ocasião, fez grande defesa do projeto o deputado Justiniano de Serpa.
No dia seguinte, 26 de outubro, o projeto vai à segunda discussão, quando o deputado José Martiniano Peixoto de Alencar apresenta emenda sugerindo a mudança do nome para Visconde do Rio Branco, e o deputado padre Sizenando Marcos apresenta outra em que, embora aceitando a elevação, propõe não serem aumentados os ordenados dos professores (vem de longe a falta de apoio à educação).
Contra esta se insurge o deputado Raimundo Carlos da Silva Peixoto, enfrentando o padre Sizenando em discussão, mas ambas as emendas são rejeitadas.
No dia 27 de outubro, a Assembleia Provincial faz a terceira discussão do projeto e ainda falam, contra, os deputados padre Sizenando e José Mendes Pereira de Vasconcelos, pronunciando-se, a favor, os deputados Belisário Cícero Alexandrino e Justiniano de Serpa, com apresentação de emenda, assim concebida:
“FICA ELEVADA À CATEGORIA DE CIDADE, COM A MESMA DENOMINAÇÃO, A VILA DE CASCAVEL, continuando em vigor a Lei Provincial no 1.065 de 7 de novembro de 1863”, que tem por finalidade garantir à vila de Aquiraz a sede da comarca.
O projeto é aprovado com esta emenda, tendo votado contra os deputados Sizenando Marcos de Castro e Silva, José Mendes Pereira de Vasconcelos, Custódio Ribeiro Guimarães, Arcádio Lindolpho de Almeida Fortuna e Francisco Barbosa de Paula Pessoa.
No dia 29, ainda de outubro, é aprovada a redação final do projeto, logo remetido ao presidente da província, Dr. Sátiro de Oliveira Dias, para sanção.
Finalmente, NO DIA 2 DE NOVEMBRO DE 1883, É SANCIONADA A LEI No 2.039, CRIANDO, PARA SEMPRE, A CIDADE DE CASCAVEL, SEDE DO MUNICÍPIO DO MESMO NOME.
[Fonte: Cascavel 326 anos]