“Prefeitura Municipal de Cascavel, em 14 de Maio de 1932.
Exmo. Sr. Capitão Roberto Carneiro de Mendonça.
D.D. Interventor Federal neste Estado
Fortaleza
Como prefeito municipal de Cascavel, tenho a honra de dirigir-me a V.
Excia. para tratar de dois de seus interesses vitais.
O vale do rio Pirangi é uma zona das mais ferteis do municipio e pela sua produção e exportação, torna-se nos tempos prosperos, um dos maiores contribuintes dos cofres publicos.
Com a seca atual, as populações ribeirinhas acham-se a braços com a miséria mais dolorosa: a falta absoluta dagua as obriga a irem buscal-a a tres léguas de distancia, ao mesmo tempo que as verbas destinadas aos flagelados desta zona e dificuldades de varias outras ordens não lhes permitem socorro eficaz.
Bem se poderia, porém, atenuar o seu sofrimento, com a perfuração de poços artificiais, obras economicas e definitivas cujos efeitos salutares se prolongariam muito além do fim da crise presente; mas são por demais precários os recursos da Prefeitura para atender ás exigencias da Inspetoria F. O. C. Sêcas, no que diz respeito ao deposito ou caução. Entretanto, é urgente, urgentíssimo seja essa dificuldade vencida, sob pena de se vêr dentro de um mês, toda aquela população emigrar.
Acrescento a V. Excia. que tomei a iniciativa de requerer á Inspetoria de Sêcas a perfuração de dois poços publicos, um em Pitombeiras, outro em São João, nucleos de treis mil habitantes cada um, localizados no referido vale; sendo deferido o requerimento o que é de esperar, ficará a Prefeitura em dificuldades para recolher aos cofres federais as duas sanções de 500$000 cada; tratando-se porém de um serviço inadiavel e altamente benfazejo, espero, e comigo, todo o municipio – que o Estado o ampare nesta hora de aflição, fornecendo por dadiva ou emprestimo a importancia necessaria – 1:000$000 – e interferindo com o seu prestigio perante o poder competente, afim de que seja quanto antes, enviada para o local referido uma das perfuratrizes da Inspetoria.
Outra questão largamente interessante para o Municipio é a construção do açude publico de Cascavel.
Trata-se de um reservatorio de pequenas proporções, feito em 1877, que prestou até 1924 assinalados serviços á população. Nessa época porém, 1924, houve um grande inverno, e talvez algum descuido na conservação da parede e como consequencia o arrombamento do reservatorio e sua inutilização que ainda perdura. Era êle que servia de bebedouro e lavadouro aos animais que concorriam em numero de 1500, ás afamadas feiras de Cascavel todos os domingos; servia enormemente aos sitios proximos, aumentando-lhes a colheita de cana de assucar e melhorando-lhes a qualidade, graças á humidade transmitida da vizinhança; facilitava grandemente ás humildes lavadeiras, dando-lhes bem perto da cidade agua bôa e farta para os seus misteres.
Desde 1924 mudaram as condições: os animais trazidos á feira foram muito reduzidos no seu numero pelas dificuldades locais, decaindo acentuadamente as rendas da Prefeitura; e a este menor numero é dado a agua das cacimbas publicas penosamente retiradas de 15 ou mais metros de profundidade; nesse habito, além do perigo em que fica a população de sentir falta dagua (porque as cacimbas não são inesgotaveis) ha um atentado flagrante á higiene e saúde publica. Os sitios vizinhos perderam muito de sua antiga fecundidade caindo tambem a sua safra de cana a coeficientes muito mais baixos.
Não se discutem as excepcionais vantagens da reconstrução da parede, e não é razoavel nem humano, nem justo que no municipio de Cascavel nada se faça em questão de açudagem no momento em que centenas de patricios com fome pedem ao Governo a esmola de um trabalho.
Tomaria então, com a devida venia, a liberdade de sugerir a V. Excia. a solução seguinte: o Estado pediria a cooperação da Inspetoria, ela entrando com 70% das despesas como é do seu regulamento, isto naturalmente após orçada a obra e feitos os necessarios estudos; o Estado entraria com os 30% restantes, encarregando pessôa idonea, da direção do serviço, sob a fiscalização de um tecnico da Inspetoria.
Não haverá terras a indenisar, porquanto se trata de uma reconstrução e as terras a serem cobertas pelas aguas, porque já o eram até 1924, a ninguém pertencem, sinão ao publico, á Municipalidade.
É excusado dizer que a população de Cascavel, em particular as suas classes conservadores, vêm na realização dessa obra a sua aspiração mais cara, e, neste momento, o seu Prefeito é o simples portavoz de suas necessidades mais prementes.
Agradecendo antecipadamente em nome do municipio, apresento a V. Excia. os meus protestos de maior estima digo admiração á sua obra admi-nistrativa no Governo do Estado. Atenciosas Saudações
Lauro Vieira Chaves – Prefeito Municipal”
[Fonte: Cascavel 326 anos]