Antigamente não existia outro meio de transporte a não ser os jumentos, burros, mulas e cavalos, que transportavam todos os tipos de alimentos e bebidas em ajuntamentos, às vezes, de dezenas de animais formando enormes comboios, vindos das mais diversas localidades do Ceará, entregando encomendas e enfrentando os perigos das estradas ou da noite. Assim também era em Cascavel, comboios vinham entregar nas diversas localidades desta cidade toda sorte de produtos.
Conta-se que, certa vez, um homem trazia um comboio de cachaça de um lugar muito longe, vindo lá das estradas do Choró, uma região do interior de Cascavel, aproximadamente uns três dias de viagem. O comboio era pequeno, mais ou menos quatro animais: uns burros atrelados, todos com suas ancoretas cheias de cachaça, e o cavalo do único comboieiro.
Seguia viagem em direção ao Coaçu, uma pequena localidade antes das Pedrinhas.
Era noite, com poucas estrelas no céu, ameaçava chover, até que o comboieiro chegou ao local da entrega, uma bodega da localidade. Um senhor de idade era o proprietário. O comboieiro foi pago e convidado pelo dono da bodega para ficar a noite em sua casa até o quebrar da barra, a estrada não era segura àquelas horas mortas, mas o homem recusou a proposta e se ajeitou para a viagem de volta. Não quis nem saber de descansar e caiu na estrada. Certo tempo depois, quando passava por um trecho deserto, ele avistou uma pessoa que vinha na direção contrária e que, de repente, em uma distração, desapareceu. Ele ficou perplexo com o que viu. Passado mais um tempo, a tal pessoa novamente apareceu e voltou a desaparecer em seguida. Os animais estavam assustados, o comboieiro não sabia o que fazer com medo do que vira. Pouco depois, a visão reapareceu, desta vez, frente a frente com o homem. Era uma pessoa alta, o seu rosto era coberto pelos cabelos e trajava uma roupa clara e longa. O cavalo assustado saiu em disparada mata adentro e aquele homem nunca mais quis voltar a entregar encomendas naquela estrada.
Para bem bem da verdade seja dito que muitos pescadores vindos do Alagamar por aquele caminho e viajantes que por ali passavam, encontraram-se, por diversas vezes, com essa visagem que se aproximava sorrateiramente à noite ou aparecia diante dos viajantes e os seguia, mas o certo é que ninguém sabe do que se trata aquela assombração e ainda hoje há pessoas que não ousam passar por aquele caminho sozinhas à noite.
[Airton Dias. A Visagem do Coaçu. In: A Serra da Mataquiri, o Rio Malcozinhado e Outras Histórias. 2. ed. Fortaleza: Premius, 2018, p. 13-14. Ilustração: Wescley Barros Borges – colorização: Hugo Cavalcante]